Os Bastidores de Uma Garota de Programa

Publié le par Eneliram de Oliveira

Sabemos que a prostituição é uma das mais velhas profissões de todos os tempos.  E Mesmo que muita coisa tenha evoluído, em muitos paises essa conduta ainda é considerada ilegal. Mas, sabemos que existe em toda parte, e por isso o TEM foi falar de perto com uma garota de programa, a "Anelize Rammé", que nos conta um pouco desta profissão tão velha como o mundo.

TEM: Fale-nos de como você decidiu "sair do armário" e se assumir como travestir?

Anelize Rammé: A gente sempre sabe dentro de nós mesmos, pois nos conhecemos melhor que ninguém, cada um se conhece e sabe dos seus anseios. Porém, existem pessoas mais destemidas e outras menos favorecidas de coragem. Que não foi o meu caso. Então sempre me senti "viking". Eu não era como os outros meninos, sempre gostei e fui atirada por brincadeiras tidas como de meninas e desde que me lembro me interessei por homens. E dentro de mim achava aquilo normal, o interesse, a curiosidade foi isso que me levou logicamente, como criança, moradora de uma cidade pequena, não tem como você se assumir, então vamos escondendo dentro de si a vontade de aflorar, mas sem condições. Então, no momento certo a borboleta bateu asas e voou. É simplesmente uma questão de liberdade, de apoio que muitas vezes a gente não encontra. Então no momento certo eu chutei o balde, chegou a hora, basta! Chega de viver de aparências, manter uma imagem que não condiz com a realidade. Os meus amigos sempre souberam o que eu era, somente dentro de casa, minha família tinha um grande ponto de interrogação, mas, eu acredito que até mesmo eles  sabiam,  que tipo assim, a gente quer na casa alheia, jamais na nossa.

TEM: Como você veio para a França e como entrou na profissão ou o que lhe fez entrar nela?

Anelize Rammé: Infelizmente nós sabemos que em pleno século XXI a disponibilidade no mercado de trabalho para os travestis, ela é extremamente restrita, são poucas as pessoas trans que estão em um patamar mais elevado a  nível de cargo, em função do seu conhecimento, de inteligência, de mérito, porque o que não falta são "Ns" pessoas trans capacitadas, diplomadas, mas que infelizmente o preconceito ainda prepondera. Então, as portas são praticamente ou quase todas fechadas, porque as pessoas não veem o conhecimento, o ser humano, é a orientação que passa na frente. Então é isso o que leva a gente a buscar essa profissão,  a prostituição, a vida de scott e que infelizmente é a famosa "vida fácil", que de fácil não tem nada, como diz Caetano Veloso "cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é", e somente a gente que vive, que sente na pele, sabemos o quanto de fácil não tem nada, pelo contrário. E o que me levou a isso foi a oportunidade de trabalho, pois como a gente vai sobreviver se não tem trabalho? A partir do momento que você assume uma vida, que você é maior de idade, você tem que correr  atrás dos seus objetivos, focar e se não vem de uma forma, vem de outra, desde  que seja digna, se é decente ou não, não sei, mas não importa o que as pessoas pensam, desde que eu veja, entenda que ela é decente, que eu não esteja fazendo mal a ninguém, então para mim estar válido . E eu vim para a França através de uma amiga que eu conheci no meu Estado, ela já morava aqui, então ela me convidou, eu aceitei e estou aqui até hoje.

TEM: Há quanto tempo você está na profissão? Começou aqui na França ou já trabalhava no Brasil?

Anelize Rammé: Eu estou na profissão à 20 anos, eu comecei em 1998 no Brasil. 

TEM: Qual o tipo de cliente que mais te procura, você traçaria um perfil mais comum dos homens? Você saberia dizer a media de idade, classe social, se solteiros, casados ou casais?

Anelize Rammé: Eu acredito que o homem, cliente que mais me procura é aquele que está insatisfeito com alguma coisa, de repente, como eu falei no início do interview tem pessoas que vivem de aparências, sustentam uma vida que não condiz com seu íntimo, com seus anseios, desejos. E por outro lado existe a fantasia, por tesão mesmo. Eu não posso falar com cem por cento de certeza, dizer que são pessoas que tenha problema, não seria justo. Mas, o perfil comum dos homens é insatisfação e curiosidade. E não tem idade, pois a gente trabalha com jovens, medianos e senhores de idade, que já passaram dos sessenta, oitenta, as vezes até mais. Então não tem uma média de idade. É bem mista. E quanto a classe social, são de todas as classes sociais. E com casais eu não saio, não gosto.E tem casado, solteiro, é um pouco de tudo.

TEM: Algumas pessoas consideram a sua profissão como algo pesado, tal como ter que encarar homem mal educado, outros que você não sinta a mínima atração e assim por diante. Você considera a sua profissão pesada até que ponto?

Anelize Rammé: Logicamente que é uma profissão que nem todo mundo encara né, mesmo que por necessidade, conheço pessoas que não se sentem minimamente atraídas em função disso. Mas, toda profissional do sexo ela sabe inteligentemente se defender, porque a gente trabalha com pessoas de todas as personalidades. A gente exerce até um pouco a função de psicologa, as vezes até de psiquiatra, digamos de passagem, é uma questão de ouvir, pois nem sempre as pessoas nos procuram pelo ato em si, ela prefere uma companhia, precisando desabafar, o casamento não estar bom, então ela une o útil ao agradável, buscando uma pessoa para fazer confidências. E logicamente que tem os famosos pesados, como a gente fala, que acham que estão pagando e podem tudo. E logicamente que não funciona assim. Eu considero minha profissão pesada realmente nesse ponto de você ir para cama com uma pessoa que você não sente nada, é o  único lado que eu vejo e classificaria como pesada, mas são ossos do ofício , quando entramos nisso já sabemos que nada é como gostaríamos que fosse. Mas, a experiência faz com que a gente dê uma grande amenizada nesse aspecto.

TEM: Como funciona seu trabalho aqui na França, o que vocês fazem para driblar a fiscalização?

Anelize Rammé: Graças a Deus nunca tive problemas com isso. Não é declarado, então a gente se vira como pode. Então, eu acredito que não tenha problema quanto a fiscalização, pois não pagamos impostos, não é uma profissão declarada, então, se fosse seria muito melhor, mas a gente sempre dar aquele jeitinho brasileiro ou seja de se virar nos 30. E o meu trabalho a gente faz as famosas tournês, uma temporada em uma cidade, uma temporada em outra, e assim vai, vai viajando, turistando e trabalhando. 

TEM: Existem muitas brasileiras fazendo esse trabalho aqui? E de outras nacionalidades?

Anelize Rammé: Existe e como existe, todas as nacionalidades, raças e credos. Hoje em dia o mercado de trabalho cada dia que passa aumenta mais. Já trabalhei com topo tipo de nacionalidade, equatoriana, tarsianas, venezuelanas, colombianas, dominicanas, francesas...de quase todas as nacinalidades.

TEM: Como você lida constantemente com a possiblidade de contrair alguma doença sexualmente transmissível ? Não que esse problema seja apenas nesse meio, mas sim porque você estaria completamente exposta à ele. 

Anelize Rammé: Quanto a isso existe a prevenção, então não é uma coisa que me preocupe porque a gente se previne, e prevenção é o meio mais eficaz de evitar as DSTs. Muitas vezes as pessoas se contaminam dentro de um relacionamento sério, pois muitas vezes um dos lados tem uma vida dupla e acaba trazendo para dentro de casa. Sendo assim, ninguém estar livre de se contaminar ou contrair uma doença, então o meio mais eficaz mesmo é a prevenção. Quanto a isso não tenho problema nenhum, pois a gente se previne e faço também minhas despistagens e sabemos que a prevenção é o meio mais eficaz.

TEM: Você ja levou muitos calotes? Existe uma maneira de reduzir a probabilidade disso acontecer?

Anelize Rammé: E como  levei (rsrsrs), quando a gente é marinheira de primeira viagem pega muitos calotes, me iludiram muito. Então você não tem que ser inexperiente, , você tem que pegar o barco  andando. Hoje em dia como  já estamos macaca velha, calejada, a maneira mais eficiente de reduzir os calotes é exigir pagamento antecipado, ou seja aquela velha história , toma lá , da cá. 

TEM:  Você disse que tem 20 anos que esta nessa profissão, antes você tinha outra profissão?

Anelize Rammé: Infelizmente não, não tive outra profissão porque a 20 anos terminei somente o ensino médio e não tive outra profissão, tive que optar por isso, fazer a vida para me sustentar.

TEM: Para você é mais fácil  fazer esse trabalho aqui na Europa ou no Brasil?

Anelize Rammé: Com certeza, milhões de vezes na Europa do que no Brasil. Amo meu país , sou patriota mas meu país esta muito em decalagem em relação a Europa. Claro que aqui também existe preconceito, mas em nada se compara ao Brasil. Aqui as pessoas "aceitam" muito mais que na minha terra, pois sou tratada com respeito, com dignidade, coisa que no Brasil raramente acontece.

TEM: E nos  horários vagos, o que você costuma e gosta de fazer?

Anelize Rammé: Nos horários vagos como toda menina gosto de ler, buscar informação, gosto de me divertir, ir na balada, conversar com os amigos. Independente da vida que levo e da minha orientação sexual, tenho as mesmas perspectivas de vida que todo mundo. Prezo a família, os amigos e tento viver e aproveitar o  máximo enquanto estou por aqui de passagem.

TEM: Quais são seus principais objetivos de vida pessoal?

Anelize Rammé: O principal obejtivo de vida pessoal é ascender profissionalmente e como ser humano me tornar uma pessoa melhor.

TEM: Você namora, ou é solteira, casada? Você pode falar um pouquinho da sua vida pessoal nesse sentido?

Anelize Rammé: Claro que posso. Sou solteira, não estou namorando. Estou muito bem, obrigada. Casada nunca fui. Nem quero porque fica muito dificil enquanto eu estiver nesta vida de manter um relacionamento. Primeiro que não condiz com minha realidade e eu não me vejo tendo um relacionamento fixo tendo que ir para cama com outros homens, isso é uma opinião pessoal. Respeito cada um, cada pessoa e seu modo de vida. Tem pessoas que fazem esse trabalho e tem um realcionamento sério, uma vida de casado. Eu não me vejo fazendo isso. Não combina com isso. Por isso eu aproveito para unir o útil ao agradável, quando a pessoa é legal, está me pagando eu me satisfaço e pronto. 

 

TEM: Sua família , amigos ou pessoas mais próximas sabem da sua profissão? Qual a ceitação deles?

Anelize Rammé: A minha família, ou seja meus pais não sabem, pois são pessoas que eu preservo bastante e porque são de respeito e eu jamais contaria a minha situação, a minha vida atual, pois eu tenho certeza que ia preocupá-los e isso não é minha intenção, seria um constrangimento também pois eles sabem os riscos, por isso não vejo necessidade deles saberem. Meus amigos mais próximos sabem sim, meus irmãos também sabem. Eles sabem e me apoiaram, nada muda independente da vida que faço, o que importa é a essência e o  caráter da pessoa. O que eu faço não influencia nada em minha vida familiar. Existe respeito, então se existe o respeito, que é a base de tudo, o resto vem naturalmente. Logicamente que existem olhares tortos, mas cada  um dar o que tem, e a gente é o que é. Quem quiser gostar de mim, vai gostar pelo ser humano que eu sou e não pela vida que levo. Os amigos sabem sim, os conhecidos não. E se desconfiam, nunca terão certeza, pois não contarei, aprendi que nem todo mundo é digno da confiança da gente.

TEM: Você  já sofreu algum abuso, ou agressão física de clientes?

Anelize Rammé: Abuso não, mas agredida  fui, sim. E roubada também. Isso acontece principalmente quando a gente trabalha na rua, não estamos imunes de passar por  esssas situações. A agressão não foi nem de clientes, mas de pessoas maldosas, sem caráter, escrúpulo, sem Deus no coração, que vivem para fazer o mau as outras pessoas.

TEM: Gostaria de saber se você gosta desta profissão ou faz somente por necessidade?

Anelize Rammé: Ah gostar, gostar, não. Eu faço por necessidade, porque eu preciso. Parei de estudar, não tenho curso superior, então, a gente não pode viver dependendo dos outros, então se eu posso, eu vou correr atrás, não importa como, o importante que venha, pois prefiro fazer isso e viver dignamente, do que viver de favores. 

TEM: As pessoas costuma dizer que toda garota de programa se droga. Qual seu ponto de vista sobre esta afirmação?

Anelize Rammé: Discordo completamente. Isso é onde estamos falando de preconceito, as pessoas acham que a verdade é delas e ela é unica e indissolúvel. NAO É  VERDADE! Nem toda garota de programa se droga. As pessoas deveriam primeiro conhecer  para afirmar. Eu morei com muitas meninas que não fumavam e nem bebiam. Esse é o problema do mundo da prostituição, as pessoas não nos veem pela emoção, com sentimento, com bons olhos, somos julgadas pelo que fazemos. E somos obrigadas a assumir uma realidade que não é nossa. Não é porque estou nesta vida que sou obrigada a me drogar. 

TEM:Existe muita inveja, puxação de tapete das outras garotas de programa? E como você lida com o preconceito?

Anelize Rammé: Em todo e qualquer meio existe a puxação de tapete. A inveja, o recalque como a gente fala. Mas, isso com o tempo vamos aprendendo a ter uma visão dos fatos, então ficamos de sobreaviso. Quando vemos pessoas com desvio de caráter, vamos evitando, pois existem pessoas maravilhosas, boas de coração, que pensa e age como você, então a gente se identifica, se apega. Como estamos longe da família, sempre nos falta alguma coisa. Então nos apegamos as pessoas boas, e as ruins a gente evita. Se percebo que a pessoa é assim,me afasto. Quanto ao preconceito, eu vou te falar uma coisa, nem perco mais o meu tempo, pois enquanto existir ser humano sobre a terra, vai existir o preconceito, nunca vai acabar. Graças a Deus as coisas mudaram bastante, hoje em dia nós podemos adotar, graças a leis, mudar o nome. Eu acho digno, pois é constragedor chegar em um aeroporto, no banco ou em outro lugar, você com aparência de mulher, e o documento com o sexo masculino. E muito constrangedor. Já passei por isso muitas vezes. Mas, isso estar mudando. E quanto ao preconceito tenho consciência que sempre vou precisar lidar e procurar um meio de sair pela tangente.

TEM: Como você se enxerga daqui a 10 anos? Como você sonha estar?

Anelize Rammé: Espero esta uma coroa, pois vou estar uma senhora de idade (rsrsrsrs). Então, eu espero estar bem comigo e com o espelho e principalmente encaminhada na vida profissionalmente, estável finaceiramente. Muito obrigada pela oportunidade, pois todo esclarecimento é válido para que as pessoas nos vejam como seres humanos que somos. Espero que esse interview possa contribuir de alguma forma e que através dela as pessoas que tem um certo preconceito revejam a sua maneira de nos ver. 

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